terça-feira, outubro 03, 2006

E a lua anda tonta com tanto esplendor

No último post eu falei de riqueza.
Hoje vou falar de miséria.
Não vou me estender na miséria humana, porque nós seres humanos somos muito miseráveis, em todos os lugares, em todos os povos, em todas as línguas. Sempre há alguém querendo dar uma de espertinho, querendo prejudicar o planeta, cheio de insensibilidade para com as pessoas e com o mundo. Vive-se uma vida cada um por si.
Quero falar, sim, sobre miséria. Porque ela existe, está muito próxima de nós. Está espalhada por tudo quanto é canto. E não é relativa: ou se é miserável, ou não é.
Miséria é quando a pessoa acorda sem saber se vai sobreviver aquele dia. Está completamente desamparada pela sociedade. Passa fome constantemente. Pode perder até noção da própria lucidez. Pode sentir dores, doenças, morrer de causas ínfimas. Sujeita-se a condições indignas. Não tem nenhuma chance de se estruturar de alguma maneira, porque tudo lhe é difícil, inacessível. Miséria é muito diferente de pobreza. Na miséria as possibilidades são mais reduzidas.
Acho engraçado o termo vagabundo de rua. Quem o utiliza só pode estar ignorando por completo a situação que envolve os desabrigados, principalmente os alcoólicos.
Há quem se ache superior a estas pessoas, e nem cogitam: se estivessem na situação deles agiriam de maneira?
Fácil fingir que no mundo não há dores, não há problemas. E se podemos fazer alguma coisa?
Sim.
Fácil.
Outro dia eu tive notícias do Antônio.
Ele é mendigo há anos na rua da mãe do Márcio.
Sempre se ofereceu comida, alguma roupa, uma conversa. Sempre se conheceu a sua estória.
Bêbado na maioria das vezes, lúcido um pouco do tempo, tinha vindo do interior, onde tinha deixado família. Não queria voltar para casa.
Outro dia, as notícias foram muito boas. Antônio estava "limpo". Já contava os dias sem embriaguez.
A igreja ali perto arrecada materiais recicláveis. Eu sempre separo os recicláveis do lixo e levo lá. Um pouco de tudo: papel, plástico, vidro. Embalagens na maioria das vezes. Em uma semana a gente junta tanta coisa que se não dá tempo de levar para a igreja faz uma bagunça. Mas tudo bem. São coisas da vida. O importante é que a gente continua cooperando.
Esta igreja conta com trabalhadores de bem. São ex-moradores de rua. Pessoas que antes tinham esquecido o que era ser tratado com respeito. Um senhor me disse que ficou emocionado na primeira vez que foi tratado por senhor. Que se sentiu gente de novo.
Pois é. Antônio chegou a esta igreja. Eles o enviaram a uma clínica de recuperação. Hoje trabalha no projeto. Tem uma vida, tem dignidade. Encara o vício como doença, o que realmente é.
Sei que infelizmente esses trabalhadores que carregam carroças o dia todo e fazem um grande bem à sociedade (porque fazem um serviço muito importante para o meio-ambiente e limpam as ruas) sofrem um tremendo preconceito. Infelizmente. Mas fazer o quê? O ser humano é miserável. Nem sempre tem competência para avaliar o certo e o errado.
Enfim, fiquei muito satisfeita por este meu trabalho de reciclagem aqui em casa. Senti até orgulho de minha família que me ajuda nesta tarefa. Senti-me feliz por saber dos resultados.
A gente não consegue consertar o mundo. Não dá. Muita coisa não tem nem conserto, infelizmente. Mas isso não quer dizer que a gente não precise fazer absolutamente nada. No mínimo, podemos manter a nossa cabeça aberta e não desrespeitar aquele que sofre.

Um comentário:

sabugo disse...

oh vida! e o q fazemos com isso? Vamos em frente e se puder levantar um ou outro ou um montão no caminho, vamos lá! Não dá pra dar a mão a todos, nem carregar todos (imagina, são 6,5 bilhões no mundo todo, no mínimo metade disso é miserável... vamos supor q apenas 3 bilhões - um pouquinho menos q metade, isso já sei lá qtos zeros dá).
Mas é igual a história do homem q jogava as estrelas do mar "encalhadas" na areia de volta ao mar, haviam milhares e o fulano retornou ao habitat das fulanas umas trinta, ai chega um outro e diz: e aí mané, vc acha q vai fazer muita diferença jogando uma ou outra? Ai o outro responde tacando a trigéssima primeira: Não, mas pra esta daqui, com certeza fez! Engraçada essa vida, todos temos sangue, carne, ossos, veias, tendões, pêlos e outras coisitas, mas muitos acham q são mais e nem querem saber dos q são menos - isto é se alguém pode ser menos... mas a miséria, como tudo é relativa e deixa ir embora pq já estou entrando em uma redundância prolixa q nem sei, rerere!